Uma exposição de alguns dos livros de artista da coleção de Aberto Manguel/Espaço Atlântida e de um conjunto heterogéneo de outras práticas artísticas que se debruçam sobre o conceito alargado do livro.
Os livros de artista desdobram, ampliam ou expandem aquilo que entendemos pelo objeto livro. Nesta exposição, procura-se evidenciar os processos de desobediência desencadeados pelos livros de artistas – quanto aos lugares da literatura e aos espaços expectáveis da arte.
Livros Desobedientes / Unruly Books é uma co-produção entre o Espaço Atlântida – Centro de Estudos da História da Leitura e a Brotéria. A exposição estará aberta ao público entre 15 setembro e 9 de novembro, na Brotéria, 10h – 18h (encerra aos domingos). A entrada é gratuita.
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Livro de artista é todo objeto plástico que se desenvolve em torno ou a partir do referente tipo de livro. Não se trata por isso de livros nos quais se reproduzem imagens do trabalho de um artista, nem tão pouco de livros nos quais apenas se ilustram textos de um determinado escritor. Por livro de artista entendemos aqui todos os objetos que, enquanto obra em si mesma, possam de algum modo remeter para o campo formal do livro. É o artista quem tem controlo sobre o produto final deste trabalho, podendo assim tratar-se de objetos únicos ou de elementos produzidos em séries mais ao menos amplas. No entanto, são objetos na charneira entre a possibilidade da reprodução e a unicidade do gesto único, individualizado.
A invenção dos caracteres móveis despoletou uma propagação da imprensa que ditou um longo caminho da indústria do livro. Ao longos dos séculos o livro tornou-se o dispositivo mais universal e engenhoso da produção cultural, perpetuando e divulgando o conhecimento. No entanto, a inquieta atividade artística da década de 60, responsável pelo fim de tantas fronteiras disciplinares, trabalhou com o livro enquanto meio, ou suporte, de uma prática híbrida ativando intercâmbios entre escritores, designers gráficos e artistas plásticos. Deste modo, o que vemos quando mergulhamos na difícil categoria do livro de artista é que da manufatura à indústria, o livro ou a publicação análoga formam efetivamente um corpo sui generis dentro das práticas artísticas contemporâneas. Assim, nasce a ideia de Livros desobedientes/Unruly books: uma exposição de alguns dos livros de artista da coleção de Alberto Manguel* e de um conjunto heterogéneo de outras práticas artísticas que se debruçam sobre este conceito alargado do livro.
Os livros de artista desdobram, ampliam ou expandem aquilo que ainda hoje se entende tipicamente pelo objeto “livro”. Nesta exposição procuramos, através do material apresentado, denunciar os processos de uma autêntica desobediência que os livros de artista desencadeiam – quanto aos lugares da literatura e aos espaços expectáveis da arte. À surpreendente recolha de Alberto Manguel, juntamos um conjunto de elementos com grande importância para o desenvolvimento desta investigação. Encontra-se assim um modo de pontuar um certo desenvolvimento cronológico desta prática, mostrando-nos a metamorfose que se manifesta fora de formato e à margem da categorização.
Toda a narrativa, tal como todo o pensamento, é declinado em imagens. Os processos da literatura, da alma, do mundo afetivo, da fantasia, do sonho, ou de qualquer delírio ou visão mística existem imageticamente. Como diz Alberto Manguel,
“formalmente, as narrativas existem no tempo, e as imagens, no espaço.”
Portanto os livros de artistas lêem-se com os olhos da imaginação e por isso resistem e desobedecem até ao propósito com o qual são compostos. Nesta recolha descobrimos trabalhos de artistas, escritores, manifestantes, ou sonhadores. Por isso, estes livros são desobedientes à leitura, ou ao seu uso, ou até mesmo à própria arte.